Para anunciar os vencedores do prêmio, a 15ª Edição do Prêmio Innovare reuniu finalistas de oito estados no Supremo Tribunal Federal, em Brasília, no dia 06/12. No total, foram 654 práticas selecionadas em seis categorias de premiação: Tribunal, Juiz, Ministério Público, Defensoria Pública, Advocacia e Justiça e Cidadania. Egresso do Programa de Pós-Graduação em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia (PPGEDAM/NUMA/UFPA), Márcio Teixeira Bittencourt foi o vencedor da categoria Juiz.

O Prêmio Innovare tem por objetivo identificar, divulgar e difundir práticas que contribuam para o aprimoramento da Justiça no Brasil. Márcio Bittencourt, Juiz de Direito Titular da 2ª Vara Cível e Empresarial de Marabá (2º Entrância) foi premiado por conta de sua atuação com no "Plano de execução civil ambiental: o desafio da recomposição do bem jurídico degradado" desenvolvido em Marabá. O plano objetiva a reparação de danos ambientais com o reflorestamento suficiente para cobrir toda a área degradada. A aquisição das mudas e as despesas com o plantio e manutenção ficam a cargo da empresa responsável pelo dano ambiental.

Egresso do PPGEDAM em 2015, Márcio Bittencourt desenvolveu sua dissertação "A justiça ambiental e os grandes empreendimentos do setor elétrico na Amazônia paraense" sob orientação do Prof. Gilberto de Miranda Rocha e coorientação do Prof. Mário Vasconcellos Sobrinho. O egresso ressalta que "um dos pontos fortes e importantes para o desenvolvimento da prática que motivou a premiação foi a excelente formação proporcionada pelo PPGEDAM".

Assim que soubemos do resultado da premiação nacional, e como parte da política de acompanhamento dos egressos do PPGEDAM, procuramos Márcio para saber um pouco mais sobre a prática do Plano. Ele nos enviou algumas perguntas e respostas que nos ajudam a compreender sua experiência na aplicabilidade e execução das ações civis em defesa da floresta amazônica. Acompanhe!

1. Qual é o objetivo do “Plano de Execução Civil Ambiental”?

O Projeto Execução Civil Ambiental objetiva a reparação in natura que consiste na condenação do requerido a reparar o dano ambiental efetivado, mediante o reflorestamento suficiente para cobrir toda a área indevidamente degradada, que teve toda a sua madeira ilicitamente explorada, e/ou nos casos de madeira apreendida a proporcionalidade em metros cúbicos das espécies que tenham sido apreendidas em sua maioria de grande valor econômico ou ameaçadas de extinção.

2. E como funciona?

Todas as Ações Cíveis Ambientais que tenham por objeto a supressão irregular da Floresta Amazônica, o transporte irregular de madeira, o transporte de madeira, carvão ou derivados sem a Guia Florestal ou Documento de Origem de Florestal ou fraudes nos SISFLORA-PA, adotamos o entendimento de que estão relacionadas de forma direta ou indireta com a degradação da Floresta Amazônica e por isso para fins de efetividade das sentenças procedentes ou parcialmente procedentes tem por objeto a recomposição da floresta Amazônica. 

3. O que motivou a origem do Plano?

Dar efetividade às sentenças ambientais e cumprir o objetivo das Ações Civis Públicas.

4. Como era o rito para as ações relacionadas a reparação de danos ambientais antes, e o que mudou com o plano?

Mesmo fazendo a supressão de vários hectares da Floresta Amazônica, inclusive com a exploração clandestina irregular de espécies de grande valor econômico eram celebrados acordos de 01 (um) ou (02) dois salários mínimos. Procedimento que é um estímulo ao desmatamento e inclusive não deveria nem mesmo nos Juizados Especiais Criminais - Lei de Crimes Ambientais nº 9.605/98, sem contemplar o reflorestamento (composição civil).

5.  Quais as áreas prioritárias contempladas pelo plano? E como foram ou são escolhidas?

As áreas prioritárias foram escolhidas por meio de reuniões de trabalho e visitas técnicas realizadas com a participação de instituições parceiras. Uma vez que a mata ciliar urbana dos Rios Tocantins e Itacaiúnas estão muito degradadas em Marabá e para fins de preservá-las foi demarcada uma área para a criação do Parque Ambiental Linear “Rio Itacaiúnas” – Grota do Aeroporto, na área compreendida entre a Avenida Sororó e o limite final do Bairro Amapá, nas Áreas de Preservação Permanente e mata ciliar, conforme apresentado na Reunião de implementação do Plano de Execução Civil Ambiental. Trata-se de área que alaga até 02 (dois) quilômetros durante o período das cheias e possuem várias construções irregulares todas já devidamente identificadas e catalogadas nos anos anteriores.

6. Quais são os órgãos envolvidos no projeto e como estão interligados?

Ministério Público - Promotoria do Meio Ambiente

Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Marabá

Secretaria Municipal de Agricultura de Marabá

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará –IFPA – Campus Rural – Marabá – RADA (Programa de Pós-Graduação em Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas)

Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará – UNIFESSPA

Superintendência de Desenvolvimento Urbano de Marabá – SDU.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA

Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Sustentabilidade - SEMAS

Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará –IDEFLOR-Bio.

E mais recentemente a Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil – Pará.

7. Em novembro foi sancionada uma nova lei ambiental. De que se trata esta lei, e qual a relação que ela teria com o projeto?

Estamos no rumo certo no último dia 08/11/2018, foi publicada a Lei Federal nº 13.731/2018, que dispõe sobre mecanismos de financiamento para a arborização urbana e a recuperação de áreas degradadas, respaldando ainda mais a nossa prática.

Conforme transcrevemos:

Art. 1º  Esta Lei determina mecanismos de financiamento para a arborização urbana e para a recuperação de áreas degradadas, a partir do direcionamento de recursos arrecadados da aplicação de multa por crime, infração penal ou infração administrativa, no caso de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, assim como da cobrança de taxas pela autorização de poda e de corte de árvores.

Art. 2º  Um décimo do valor das multas por crime, infração penal ou infração administrativa decorrentes de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, arrecadadas pelos órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, será destinado à arborização urbana e à recuperação de áreas degradadas.

§ 1º  O recurso advindo das multas de que trata o caput deve ser aplicado no Município onde ocorreu a infração ou o crime ambiental.

8. Na sua visão, o que tem de diferente/especial no projeto e que permitiu chegar à final do tão cobiçado Prêmio Innovare da Justiça brasileira? E como recebeu a notícia, o que representou para você?

Ao fazer o diagnóstico e identificar que haviam poucos viveiros e poucas mudas de espécies ameaçadas de extinção e ou grande valor econômico a prática fomenta a produção das referidas espécies em contraposição ao manejo produtivo clandestino da madeira na região Amazônica. Algumas espécies, por estarem em situação de risco ao serem suprimidas/derrubadas não necessariamente conseguirão se recompor sem a intervenção humana. O Plano de Execução Civil Ambiental é uma espécie de “regulamento” entre os parceiros de como efetivar a recomposição das matas ciliares urbanas, fomentando os viveiros, pois os condenados a praticar a recomposição do bem jurídico degradado poderão adquirir a mudas dos viveiros das instituições de ensino e também dos órgãos públicos do sistema de meio ambiente e da agricultura.

Foi com grande emoção e inclusive muitas lágrimas de felicidade que reagimos ao saber que seríamos finalistas da XV Edição do Prêmio Innovare na categoria Magistrado.

Tramitam aproximadamente 8.000 (oito mil) processos na 2ª Vara Cível e Empresarial de Marabá, Vara com Competência para os processos de Família e Cíveis em Geral e Privativa para os Casamentos e Recuperação Judicial, dos quais 109 (cento e nove) ações que tenham por objeto direta ou indiretamente a supressão irregular da Floresta Amazônica.

A grande sobrecarga de trabalho tanto quantitativa quanto qualitativa precisar ser um estímulo para o desenvolvimento de práticas inovadora focadas na solução eficiente de conflitos, caso contrário fica apenas a sensação de “enxugar gelo”. Por isso prestigiamos muito o trabalho do Instituto Innovare. No ano de 2013, tivemos a Prática “Inspeção Judicial nos Imóveis em Conflito Agrário Coletivo”, deferida na Categoria Magistrado, também relacionada diretamente com os conflitos ambientais uma vez que a inovação foi a realização das inspeções judiciais com a participação não apenas das instituições responsáveis pela regularização fundiária, mas também com os órgãos ambientais em especial nos Planos de Manejo Florestal Sustentáveis.

9.  O Sr. espera que essa prática seja replicada em outras seções judiciárias do País?

Na esfera cível, que é o caso da prática PLANO DE EXECUÇÃO CIVIL AMBIENTAL, tanto o Ministério Público, quanto qualquer pessoa que tenha sido prejudicada direta ou indiretamente pelos danos ambientais poderá propor ações judiciais cíveis para fins de recomposição civil dos danos e indenização inclusive sobre as perdas e danos e lucros cessantes e até mesmo danos morais coletivos. Ou seja, um auto de infração pela prática de um crime ambiental poderá originar até mesmo três processos junto ao Poder Judiciário: 1) – Administrativo. Ex: Processo Judicial no qual a parte autuada objetiva a anulação do auto de infração por não terem sido atendidos os requisitos legais. 2) – Criminal. Ex: Lei de Crimes Ambientais/Lei nº 9.099/95 – Juizados Especiais (Crimes de Menor Potencial Ofensivo) e 3) – Civil – Ex: Ações Civis Públicas - ações judiciais cíveis para fins de recomposição civil dos danos (obrigação de fazer) e indenização pelo moral coletivo.

As 109 (cento e nove) ações que tramitam na 2ª Vara Cível e Empresarial de Marabá dizem respeito a Ações Civis Públicas propostas pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente e em sua maioria tem dois pedidos a condenação em DANOS MORAIS COLETIVOS e a OBRIGAÇÃO DE FAZER RELACIONADA RECOMPOSIÇÃO CIVIL DOS DANOS AMBIENTAIS. Assim com relação à obrigação de fazer as sentenças trazem a condenação em Reflorestar área correspondente aos metros cúbicos de madeira apreendidas e/ou proporcionalmente aos hectares suprimidos. E ainda fixação de um valor a título de indenização por danos morais coletivos, devendo a quantia ser revertida para o Fundo que cuida o art. 13 da Lei n. 7.347/85. (Lei da Ação Civil Pública). Ou seja, agora com a Lei Federal nº 13.731/2018, a prática poderá ser replicada nas esferas civil, criminal e também administrativa.

 10.   A problemática ambiental parece ainda algo distante do entendimento/conhecimento das pessoas. O senhor teria como exemplificar o quão grave é essa questão e como ela pode afetar a nossa vida?

No caso específico das invasões/ocupações irregulares de áreas de preservações permanentes, dentre as quais as matas ciliares, as consequências são catastróficas. Além das centenas de famílias que residem no local que sofrem todos os anos com os alagamentos o reflorestamento com a recomposição dos danos ambientais favorecerá toda a coletividade. Pelo fato de a área estar localizada em uma área periférica do perímetro urbano de Marabá o futuro parque ambiental além de garantir a preservação da mata ciliar será uma grande área de lazer e turismo fomentando a geração de emprego e renda e em especial um grande atrativo urbanístico para a população. Ou seja, restam contemplados os aspectos econômicos, sociais e ambientais de toda a coletividade.

11.   O senhor adota técnicas de aplicação da Justiça em lugares remotos do Brasil. Como avalia a conexão entre judiciário e sociedade no Brasil?

No ano de 2014, participamos da Prática Ribeirinho Cidadão: A Busca da Inclusão Social deferida na Categoria Tribunal de Justiça do Estado do Pará, com foco no acesso à Justiça enquanto vetor do Desenvolvimento Local da Amazônia com o atendimento das comunidades isoladas localizadas nas Unidades de Conservação e Terras Indígenas. Pratica que já executamos nas Comarcas de Altamira, Almeirim, Monte Dourado, Ilhas de Belém, São Caetano de Odivelas e agora no período de 12/11/2018 a 08/12/2018 estamos em execução na Comarca de Marabá que contempla também os Municípios de Nova Ipixuna e Bom Jesus do Tocantins.

Na atual edição, uma vez que também somos competentes para os processos de Direito de Família, submetemos a Prática TABELA DOS ALIMENTOS: ANALISE OBJETIVA DO BINÔMIO / POSSIBILIDADE NECESSIDADE – VALOR JUSTO E CORRETO, com o objetivo de definir de forma objetiva o gasto real dos ALIMENTADOS e as possibilidades dos ALIMENTANTES, utilizando para tal ferramentas eletrônicas que terão como produto final um aplicativo que está sendo desenvolvido pela Secretaria de Informática do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, inclusive com a próxima versão de Inteligência de Mediação Judicial. Só de sermos finalistas com uma prática de processo civil ambiental diante do desafio que é a gestão dos recursos naturais na Amazônia e os respectivos julgamentos dos conflitos agroambientais é um grande incentivo para a consolidação e expansão da Prática talvez auxiliando outros colegas na efetivação da Justiça. Por fim é importante ressaltar que EU AMO SER MAGISTRADO é uma grande satisfação quando é possível proferir uma sentença que solucione os conflitos, não limitando apenas a julgar o processo.